domingo, 11 de outubro de 2009

Águas de outubro



Eu estava no ônibus, sobre a ponte. O rio, negro, prosseguia seu curso, sem se preocupar com os minimalismos da vida humana que transcorriam a sua margem – sempre indiferente, até mesmo áspero, seu único objetivo era conduzir as águas calmas até o destino final.

Inevitavelmente, mergulhei-me em devaneios. Através do vidro, via as pessoas caminhando de um lado para o outro, sempre apressadas, ansiosas para chegarem a algum lugar. Quando passavam por mim, parecia que sumiam no tempo, que mergulhavam na calidez da tarde para um abismo desconhecido. E vinham carros, e motos, e lixos que bailavam na poeira.

Ainda mais envolto pelo estupor dos pensamentos, olhei para o rio. Então, sobre as águas densas, comecei a vislumbrar um fractal de vida pulsante, inalcançável ao meu toque. Pessoas que nasciam e morriam, tempos que vinham e sucumbiam, gerações intermináveis, séculos, milênios - um mundo que escorria apressado pela correnteza. Eu ali, estático. Tudo seguia seu curso ao meu redor, tudo tinha começo, meio e fim. Mas e eu? O que eu era? Eu estava à margem, era o que apenas observava.

Estar à margem. À margem do mundo, à margem da vida, à margem de nós mesmos. Tentei me lembrar do motivo que me tirara do curso do rio e me jogara abruptamente na terra áspera e arenosa. Entre milhares de coisas, lembrei-me de um ex-amigo que rejeitara um abraço meu, porque estava na frente de seus colegas. Logo ele que dizia se sentir tão bem com a minha presença. Mas aquela não fora a primeira rejeição, eu já me habituara com a sua indiferença para com meus humildes gestos de carinho. Tem gente que finge contentar-se com o simples, mas só consegue viver no que é complexo, afogando-se nas lágrimas da própria fraqueza.

Com uma tênue tristeza que enevoava minha alma aos poucos, sussurrei para mim mesmo: Ah, Juan, para quê tudo isso? Deixe as águas correrem desenfreadamente para seu rumo incerto. Não viva, fique à margem! Assim, você não sofre, assim, você não cai, não grita, não chora. Deixe a vida para os outros e fique apenas observando os sonhos deles serem pisados, a mediocridade humana se arrastando por dias incertos a caminho da morte. Você não precisa cair no rio, se não quiser!

Como eu me enganava ao, por um mero instante de devaneio, imaginar tais absurdos! Não é possível estar à margem, uma vez nascido humano. A vida já faz parte de você, já transborda em cada poro do corpo, emana de cada canto da alma. Viver é inevitável! Não há margem para nós, quem fica à margem são os deuses. Nós, humanos, estamos todos sendo arrastados pela correnteza, nesse breve e mágico percurso de águas claras e escuras que é a vida.

Nota: Essa crônica é para a Larissa. Não há palavras com as quais eu possa homenageá-la numa data tão especial como hoje, porque o amor não se mensura em letras. Amor apenas se sente, pulsante, vivo, como as águas que correm para a imensidão eterna. Tão infinitamente simples que chega a nos deixar meio perdidos, zonzos, loucos - ensandecidos com o grande mistério que transborda, límpido, em nossas almas.